2b. Resposta a Gupta (in Portuguese)

Fernando Urueta

Gostaria de começar esta breve resposta destacando o interesse da fala do Suman quanto à descrição de um contexto pouco conhecido na América Latina: os publishing studies, suas afinidades com os estudos literários e a relação de ambas as áreas com o mercado editorial no Reino Unido. Esse contexto é pouco conhecido, não só no sentido de nossa escassa familiaridade com esses espaços produtivos na Grã-Bretanha, mas no sentido em que, na América Latina, os publishing studies não experimentaram ainda o grau de desenvolvimento que tiveram nas últimas décadas no Reino Unido, um desenvolvimento que, como pode inferir-se da exposição do Suman, tem muito a ver com o desenvolvimento e com a magnitude do mercado editorial britânico.

O texto também é interessante do ponto de vista das inquietações que, com respeito ao emprego, podem ter tanto os administradores dos departamentos de estudos literários, preocupados com o destino laboral dos graduados, quanto os estudantes, preocupados com o próprio destino no mundo do trabalho. No entanto, o texto resulta interessante, não porque resolva essas inquietações, mas porque pode aprofundá-las. A fala do Suman se foca, dentre outras, na questão de se a formação em estudos literários abre realmente as portas a empreendimentos no mercado editorial e à possibilidade de conseguir o próprio sustento nesse mercado. Porém, a resposta provisória que fornece só podia ser, no máximo, difusa e desanimadora. Difusa, como salienta o Suman, pela nebulosidade e escassez dos dados a esse respeito; e desanimadora, porque em todo caso esses dados vagos e insuficientes mostram, por um lado, que a formação em estudos literários não representa nenhuma vantagem significativa na procura de emprego no setor editorial e, por outro, que o crescimento e a estabilidade do setor não implicam necessariamente um aumento das possibilidades de trabalho na indústria, mas talvez o contrário. Paradoxalmente, a indústria editorial não parece uma área muito promissora para procurar emprego, justamente, por seu próprio desenvolvimento. Um dos fatores que explicam isso, como destacou o Suman, tem a ver com as mudanças tecnológicas no setor. A mudança gradual da publicação impressa para a digital, que está acontecendo agora, e o desenvolvimento de condições que tornam mais fácil a produção e a distribuição dos livros fazem com que os gastos em mão-de-obra diminuam consideravelmente. Dessa perspectiva, o texto convida a refletir sobre como é que os programas em estudos literários vão lidar com essas mudanças na indústria editorial.

Daí surge uma primeira pergunta que eu gostaria de colocar para o Suman, que tem a ver justamente com esse problema. Na sua opinião, como é que os programas universitários de estudos literários deveriam lidar com essas mudanças? Na medida em que o campo editorial parece cada vez menos promissor para procurar emprego, esses programas deveriam simplesmente apontar para outros mercados de trabalho, mais promissores do que o mercado editorial? Ou, explorando as afinidades com os publishing studies, os estudos literários deveriam oferecer, além de conhecimento aprofundado sobre tais mudanças, uma formação prática para desempenhar-se com sucesso nessa indústria recentemente renovada?

No entanto, o maior interesse da fala do Suman reside, na minha opinião, no fato de ela levar a considerar, além da incidência dos programas universitários em estudos literários no mercado editorial, o problema da incidência do mercado nos estudos literários. O texto convida a refletir sobre isso de diferentes maneiras, quer seja pela terminologia técnica com a qual ele tem que lidar, quer seja pelo recurso necessário a dados estatísticos e relatórios oficiais; desde aquele “Pedagogy to Industry” do título, que se refere a um vínculo específico entre academia e mercado, até o último parágrafo, que coloca a pergunta sobre como os estudos literários farão frente às mudanças que o campo da publicação vem experimentando. (Aliás, mesmo o fato de nós estarmos aqui, discutindo o impacto dos estudos literários fora da academia, poderia ser lido como um convite para considerar também o problema do “impacto” daquilo que está fora da academia no interior dos estudos literários. Para dizer de outra forma, a nossa preocupação com a questão do impacto dos estudos literários no mercado parece expressar, por si só, um “impacto”, uma incidência, do mercado no nosso trabalho).

A fala do Suman leva a pensar nesse assunto de diversas formas, como disse antes, mas eu gostaria de destacar apenas uma e a partir dela colocar algumas perguntas. Estou me referindo à autocompreensão dos estudos literários como fornecedores de mão-de-obra para a indústria, neste caso indústria editorial, mas poderia falar-se também de outras, como a mídia, ou da própria academia. O texto começa afirmando que parece natural assumir que os programas universitários de estudos literários preparam estudantes para eles se empregarem no campo da publicação. Mas o texto oferece também elementos para entender que essa concepção não é tão natural assim, mas produto da incidência mais ou menos direta do mercado na academia. Essa autocompreensão parece, pelo menos parcialmente, uma consequência do fato de os programas de estudos literários se verem forçados a concorrer com os programas de publishing studies, tanto no recrutamento de alunos quanto na inserção dos graduados no mercado de trabalho, enquanto que o desenvolvimento dos publishing studies parece, por sua vez, uma consequência mais ou menos direta do crescimento do mercado editorial.

Dessa perspectiva, eu gostaria de terminar esta resposta perguntando ao Suman como ele acha que os estudos literários poderiam lidar com essa autocompreensão que, na verdade, parece vir de fora da academia. Aliás, deveriam fazer questão dela como um problema? Ou, pelo contrário, deveriam reconhecer-se a si próprios, sem problema, como fornecedores de mão-de-obra e, em consequência, transformar-se para satisfazer as demandas da indústria? Seria possível manter ambas as posições juntas? Ou seja, trabalhar sobre a base de que os estudos literários, como a academia em geral, fornecem inevitavelmente força de trabalho para a sociedade e, ao mesmo tempo, colocar em causa a ideia dos estudos literários, e da academia em geral, como fornecedores de força de trabalho?